terça-feira, setembro 05, 2006

Marcas Desgastadas
Existe prazo de validade para as marcas de partidos políticos? O sentido desta pergunta se dá pelo fato de ser notório o fenômeno da personificação dos partidos. E será que é um fenômeno atual?
Há cerca de 30 anos, me recordo dos comícios promovidos pelo MDB e ARENA na minha cidade natal: Canguçu. Tenho ainda muito forte na lembrança o cheiro e a textura do banco traseiro do carro do meu pai, um corcel GT, no qual dormia, acordava e voltava a dormir, durante os comícios promovidos pelo MDB, na colônia. Sabia que a sigla era MDB, pois ajudava a distribuir os famosos “santinhos”. Acabo de perceber o lado irônico de chamá-los de “santinhos”. Mas retomemos o ponto onde estávamos. Lembro também do esforço que meus pais faziam para convencer as pessoas a votarem no candidato deles: Mussi. Inclusive penso que todo aquele esforço era, na verdade, para eleger o amigo deles enquanto a sigla ficava em segundo plano. Mas daquela vez não “deu” o cara e sim, um tal de Quequinha da ARENA. Depois lembro-me que o tal Gilberto acabou vencendo numa outra disputa. No entanto, já morávamos em Brasília. Brasília era o nome do lugar para onde mandavam os funcionários do Banco do Brasil que faziam campanha para o MDB. Pelo menos foi assim que me explicaram nos idos de 1978. Desta época, o que ficou mais fortemente gravado na minha memória, foi a entrada abrupta de soldados fortemente armados no nosso apartamento, enquanto jantávamos. Graças a Deus o alvo deles não foram meus pais e sim um rádio amador que meu pai ganhou dos amigos quando partimos de Canguçu. Sempre muito observadora, percebi na conversa deles com meu pai, que o problema se dava pelo fato da rádio possuir alcance para falar com a União Soviética. Êta rádio bom aquele!
Mas falávamos das siglas. Uns caras que foram “convidados” a passar uma temporada fora do Brasil, voltaram. O que foi muito comemorado pelos meus pais. Neste “meio-tempo” o que era MDB virou PMDB e o que era ARENA virou PDS. Acho que os caras da ARENA não entendiam nada de recall nem de transferência de significado. Ou, quem sabe, eles não gostassem da relação que a sigla ARENA tivesse com a história dos cristãos que eram devorados por leões nas arenas do Coliseu romano. Sei lá... Até pode ser.
Disso tudo, para mim, o certo é que os dois não se juntavam nem para tomar chá. Ou não? No entanto, apareceram outras abstrações em forma de sigla partidária. O PCB, ou era PCdoB? Não sei ao certo, mas disso tudo, lembro muito bem da primeira vez que eu vi aquele bigode. Era de uma cara que me cativou logo que o vi na televisão, nem sabia o nome dele, mas tinha a ver com uma sigla que achei tão pobre. Só duas letras: PT. O meu pai o detestava e eu, que já tinha doze anos e muita vontade de irritar o meu pai, adorava.
Pobre do meu pai. Os próximos anos seriam terríveis para ele. Arranjei um namorado, o que por si só já foi um drama, mas pôde ser pior. Meu namorado gostava das duas pobres letras. E como dizem por aí, tudo pode ser ainda pior. O respeitável doutor Ulisses juntamente com um tal de Tancredo se “acolheiraram”, como disse a minha mãe, com duas figuras, que conforme me explicaram, ainda em Brasília, eram “do mal”: Maluf e Sarney. É isso aí, pessoal. A revolução da química aconteceu e a água se misturou perfeitamente com o óleo. Lá se foi a campanha das “Diretas Já” por água abaixo. Foi uma pena! Eu já tinha camiseta e tudo. E o meu pai, quase que me esqueço dele, ficou com a maior cara de tacho vazio. O pior é que o Tancredo era um cara louco de azarado e morreu antes de assumir o cargo de presidente do Brasil. A cara do Brito dando a notícia era muito parecida com a do meu pai.
Os anos foram passando, meu pai cada vez com mais cara daquilo, e eu já sabia o nome do dono do bigode: Olívio. Achei o nome muito feio, mas me acostumei. Todo dia meu pai excomungava o Olívio e as duas letrinhas. Mas achou uma salvação, virou brizolista. Mas não gostava das letras do Brizola: PDT.
Passada muita água por de baixo da ponte, eu acabei me filiando, por influência do bigode. Trabalhei muito, como diziam: militei. Gastei anos nisso. Ganhei muita experiência também. Mas as coisas foram ficando meio estranhas. Meu pai se filiou ao PT... Peraí... o coroa? Alguma coisa vai mal, estamos concordando!
Pra terminar só posso dizer uma coisa: meus filhos, agora, estão me olhando meio estranho. Acho que estou com cara de tacho vazio...

Mila

Nenhum comentário: