sexta-feira, novembro 16, 2012


Os Três Mal-Amados

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.

O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.

O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina.

O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.

Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.

O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.

O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.

O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.

O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.

O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.

O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.
João Cabral de Melo Neto

sexta-feira, agosto 24, 2007

Lévy e o Teatro Mágico


Assisti há alguns dias a um seminário com o afamado Pierre Lévy. Fiquei cara a cara com o cara, uma honra, segundo o coordenador do meu mestrado. Acho que até foi mesmo, talvez minha ignorância não me permita avaliar o quanto deveria ficar honrada. Li uns dois livros do Lévy, muito interessante e também entediante para quem gosta de ver o teatro e não as mãos que movem os bonecos. Gosto de saber que elas estão lá, mas gosto mais de curtir a beleza mágica dos bonecos.
Lévy acha que existe uma maneira de haver um espaço semântico na web. Mas o que mais gostei foi de saber que o cara apóia a pirataria, ou seja, o compartilhamento de informações. E é aqui que existe a ligação lírica que estabeleço entre Lévy e o in-fame (sem fama) O Teatro Mágico. Este só circula fazendo shows em um espaço restrito de São Paulo, mas está se expandindo pela internet. Meu filho me apresentou ontem alguns vídeos do grupo. Em um deles o vocalista convocava o público que não tivesse grana para comprar seu CD para piratearem. É assim que vai circulando a mágica do Teatro pelo ciberespaço de Lévy e nos suportes binários dos CDs pirateados. Existiria poesia na web? Sim existe e Lévy também percebeu há muito tempo.


Aqui vai uma amostrinha de O Teatro Mágico

A Bailarina e o Soldado de Chumbo


De repente toda mágica se acabou e na nossa casinha apertada
Tá faltando graça e tá sobrando espaço

To sobrando num sobrando sem ventilador

Vai dizer, que nossas preces não alcançaram o céu

Coração, que inda vem me perguntar oque conteceu

Contece seu rosto por acaso ainda tem o gosto meu

Com duas conchas nas mãos, vem vestida de ouro e poeira

Falando de um jeito maneira

Da lua, da estrela e de um certo amor

Que agora acompanha seu dia, e pra minha poesia é o ponto final

É o ponto em que recomeço, recanto e despeço da magia que balança o mundo

Bailarina, soldado de chumbo

Bailarina, soldado de chumbo

Beijo doceBailarina, soldado de chumbo

Nossa casinha pequena parece vazia sem o teu balé

Sem teu café requentado soldado de chumbo não fica de pé

Nossa casinha vazia parece pequena sem o teu balé

Sem teu café requentado soldado de chumbo não fica de pé

quarta-feira, março 14, 2007


8 de Março

Estátuas de Sal

Émile Durkhein acreditava que a queda do percentual de suicídios entre mulheres, acima de 30 anos se dava em razão delas se acostumarem aos maridos e, assim se submeteriam resignadas à vida doméstica.
Errou o velho sociólogo. Talvez nunca tenha ouvido que "os sonhos não envelhecem"... Talvez nunca tenha conhecido um tipo muito peculiar de mulher: as que possuem asas de farfalas (ou falenas). Estas teimam em não morrer, mesmo que para isso desejem a morte.
Não faço, aqui, nenhum tipo de apologia ao suicídio, muito menos de mulheres. Mas, faço sim uma denúncia: muitas mulheres estão tendo suas asas, tão cintilantes quanto invisíveis, amputadas. De um só golpe ou aos pedacinhos em rituais rotineiros de tortura.
Evoco, aqui, o sopro de Lilyth para que a delicadeza dessas mulheres do campo, das estepes, das savanas dos desertos e das cidades seja respeitada por aqueles que não compreendem e, admiradas pelos homens que já adquiriram a capacidade mágica de apreciá-la.
Para estas mulheres repito insistentemente: continuem a olhar para trás (sem medo de se tornar uma estátua de sal - mais um blefe masculino) e ofereçam muitas maçãs por aí.

Escolhi duas músicas que denunciam asas de borboletas/mulheres cruelmente arrancadas, lembrando que no mundo inteiro isso é uma prática diária.


Notícia de Jornal
Luis Reis / Haroldo Barbosa

Tentou contra a existência

Num humilde barracão.
Joana de tal, por causa de um tal João.
Depois de medicada,
Retirou-se pro seu lar.
Aí a notícia carece de exatidão,
O lar não mais existe
Ninguém volta ao que acabou
Joana é mais uma mulata triste que errou.
Errou na dose
Errou no amor
Joana errou de joão
Ninguém notou
Ninguém morou na dor que era o seu mal
A dor da gente não sai no jornal.


GOL ANULADO
João Bosco - Aldir Blanc

Quando você gritou Mengo

no segundo gol do Zico
tirei sem pensar o cinto
e bati até cansar.
Três anos vivendo juntos

e eu sempre disse contente
minha preta é uma rainha
porque não teme o batente
se garante na cozinha
e ainda é Vasco doente.
Daquele gol até hoje

o meu rádio está desligado
como se irradiasse o silêncio
de um amor terminado.
Eu aprendi que a alegria

de quem está apaixonado
é como a falsa euforia
de um gol anulado".

domingo, janeiro 21, 2007


Trinca de irmãs

Acaba de ingressar em mestrados uma trinca de irmãs: Francine, Helene e Milene Sacco. Olhares tão diferentes, mas igualmente femininos e sensíveis sobre assuntos tão diferentes. Sem dúvida contribuições malucas e caleidoscópicas dentro da dureza acadêmica.
Este post homenageia nossa rainha dos raios e trovoadas: nossa amada Fran.
Amada muita sorte e energia nesta nova fase. Beiiiiijjjjooossss!!!!

Aqui vai uma mensagem de estímulo:

Perdoem a falta de folhas,

perdoem a falta de ar

perdoem a falta de escolha,

os dias eram assim

E quando passarem à limpo,

e quando cortarem os laços

E quando soltarem os cintos,

façam a festa por mim

Quando lavarem a mágoa,

quando lavarem a alma

Quando lavarem a água, lavem os olhos por mim

Quando brotarem as flores,

quando crescerem as matas

Quando colherem os frutos digam o gosto prá mim.

("Aos nossos filhos" - Ivan Lins)

sexta-feira, janeiro 19, 2007


Hoje ganhei um amuleto/regalo de minha irmã Helene, recém aprovada no mestrado da UFRGS. Parabéns maninha!


Jorge Capadocia

Composição: Jorge Ben Jor

Jorge sentou praça na cavalaria

e eu estou feliz porque eu tambem sou da sua companhia
eu estou vestido com as roupas e as armas de jorge
para que meus inimigos tenham mãos e não me toquem
para que meus inimigos tenham pés e não me alcancem
para que meus inimigos tenham olhos e não me vejam
e nem mesmo um pensamento eles possam ter para me fazerem mal
armas de fogo, meu corpo não alcançarão
espadas, facas e lanças se quebrem, sem o meu corpo tocar
cordas,correntes se arrebentem,sem o meu corpo amarrar
pois eu estou vestido com as roupas e as armas de jorgejorge
eh de capadocia,
viva jorgejorge eh de capadocia, salve jorge
perseverança, ganhou do sórdido fingimento
e disso tudo nasceu o amor
perseverança,ganhou do sórdido fingimentoe
disso tudo nasceu o amor
ogam toca pra ogum
ogam toca pra ogum
ogam,ogam toca pra ogum
jorge eh da capadocia
jorge eh da capadocia
jorge eh da capadocia
jorge eh da capadocia


É nós em POA!

Em março Eu e Ela estaremos atracando no Porto Alegre. Na verdade, Eu e Ela tratam-se de duas pessoas: Helene e Milene. Quem é Ela e quem sou Eu é coisa pro Galeano saber. Já para nós somos as duas ao mesmo tempo.
O que importa disso tudo é que o mestrado nos espera e uma coisa é certa vamos dar muito "pau na máquina"!

segunda-feira, dezembro 18, 2006

Xô Caô

Estou percebendo algumas emanações do tipo "olho-gordo". Como estamos no fim do ano resolvi fazer uma defumação, limpezinha, no blog. Então aqui vai...

Filha Da Véia
(Luíz Américo e Braguinha)
Sou filha da véia ô

E eu não pego nada
A véia têm força, ô
Na encruzilhada
Não bati mais meu carro
Tem sempre uma grana e homem de montão
Tô sempre coberta dos pés à cabeça
Nêgo me encosta cai duro no chão
Com sete pitada da sua cachimba
Marafa e dendê
Um banho de arruda todinho cruzado
Na minha horta só tem que chover
Quem quizer que acredite
Ou então deixe de acreditar
A força que ela me deu
Só ela é quem pode tirar
Venço e não sou vencida
Aqui neste reino e em qualquer lugar
Os zóio de inveja de boi mandigueiro
A véia levou pro fundo do mar.

Sem Fantasia

Hoje acordei com saudade de beijo na nuca...
Lembrei dessa música que ouço desde menina.


Sem Fantasia
( Chico Buarque)
Vem meu menino vadio, vem sem mentir pra você
Vem, mas vem sem fantasia,
que da noite pro dia você não vai crescer
Vem, por favor não me evites, meu amor, meu convites
Minha dor meu apelos
Vou te envolver nos cabelos,vem perder-te em meus braços
Pelo amor de Deus
Vem que eu te quero fraco,vem que eu te quero tolo
Vem que eu te quero todo meu

Ah! Eu quero te dizer que o instante de te ver
Custou tanto penar, não vou me arrepender
Só vim te converncerque eu vim pra não morrer
De tanto te esperar
E quero te contardas chuvas que apanhei
Das noites que vareino escuro a te buscar
E quero te mostraras marcas que ganhei
Nas lutas contra o rei,nas discussões com Deus
E agora que cheguei eu quero a recompensa
Eu quero a prenda imensa dos carinhos teus

segunda-feira, novembro 27, 2006

Ser pensante...
Extrema solidão em que a matéria se dissolve,se perde. Dúvida que perde sua forma em face de uma matéria duvidosa. Se quiséssemos substituir o método da dúvida - método excessivamente virtual, pouco apto a libertar-nos da representação - por um método de apagamento - método mais efetivo, pois que tem para si o próprio declive do devaneio -, perceberíamos que o devaneio aéreo permite descer ao mínimo do ser imaginante, isto é, ao minimo minimorum do ser pensante.
(Gaston Bachelard)

segunda-feira, novembro 13, 2006


Agradecimento

Postei este carinho para
uma menina, com sardas lindas
e para o irmão dela, que tem o
sorriso mais lindo do mundo.
Eles me levaram um apoio e um carinho
muito gostoso, lá na PUC, ontem.

Mila

Flor-de-ir-embora
(Fátima Guedes)


Flor de ir embora

é uma flor que se alimentado
que a gente chora
Rompe a terra, decidida,
flor do meu desejo
de correr o mundo afora
Flor de sentimento
amadurecendo, aos poucos,
a minha partida
Quando a flor abrir inteira
muda a minha vida
Esperei o tempo certo
E lá vou eu, e lá vou eu
flor de ir embora, eu vou
E agora esse mundo é meu.

sexta-feira, novembro 10, 2006


Entre a cruz e
a espada



Amanhã me atiro pela primeira vez contra a espada.
Vou fazer meu primeiro teste de mestrada.
Caso morra, não se preocupem, estarei contra a espada mais algumas vezes...

Mila

sexta-feira, novembro 03, 2006


Emir e Botero

Hoje é um dia historicamente estarrecedor!!!
Após receber um abaixo-assinado que protesta contra a condenação de Emir Sader que se espressou contra a declaração, sempre intolerante e tirana, de Bornhousen em que declara que "os petistas deveriam ser eliminados por pelo menos 30 anos", Emir foi condenado por um juiz a perder seu cargo de professor e a cumprir serviços à comunidade.

Gostaria de declarar, principalmente, que Emir Sader sempre cumpriu serviços à comunidade como sociólogo. Além do mais, o judiciário continua se intrometendo de modo intolerante contra a sociedade. Quem deve cumprir a tal pena? Alguém lembre o dito juíz que existe uma coisa chamada liberdade de expressão!!! Se Bournhausen está tão interessado em extermínio que se filie além de seu partido de extrema direita em algum grupo de extermínio, talvez mais a sua cara.

Coincidentemente, enquanto lia o e-mail, abaixo-assinado, assistia à notício no Jornal Hoje de que o pintor Botero, que ilustrou as horríveis e dantescas torturas cometidas por soldados americanos contra prisioneiros iraquianos, também foi censurado. Diversas galerias de arte se negaram a exibir as telas de Botero - extrordinário artista plástico colombiano. Uma das galerias exibiu as pinturas realmente impressionantes. Agora o holocausto dos iraquianos virou história da arte. Deve ser isso que incomoda tanto!

"Dizer a verdade não é ser anti-americano. Senão, o jornal 'New York Times', a revista 'Time' e todos os jornais que denunciaram isso são anti-americanos. É preciso dizer a verdade e ter liberdade de expressão", declarou o artista colombiano.

A mim o que incomoda, deve ser aquilo que abala todo o pensamento livre do planeta: a censura.

Mila



Viva Emir Sader!
Viva Botero!

terça-feira, outubro 24, 2006



A maçã do conhecimento

Quantas vezes terei que morrer

para que possa passar
da primeira dentada na maçã,
poder comê-la por inteiro?


Tocando Em Frente
(Almir Sater / Renato Teixeira)


Ando devegar
Porque já tive pressa
Levo esse sorriso
Porque já chorei demais...
Conhecer as manhas e as manhãs
O sabor das massas e das maçãs
É preciso amor pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir


Meu inferno

Estou vivendo meu próprio inferno. O do Godard me era mais simples, afinal de contas era dele. Eu só olhava de fora. Mas o ”Inferno” de J-L Godard passou a ser o meu na busca pelo mestrado.
O desânimo é muito grande... O processo de ser aceito, para alguém que nunca se aceitou e se considera totalmente inadequado é de um peso esmagador! Por isso me sinto achatada. Uma peça que não cabe em nenhum lugar...

Mila

sexta-feira, outubro 20, 2006

Irmã Coruja

Neste momento remakeaproveito para corujar e me exibir, como irmã de artista plástica, com o trabalho da minha mui amada irmã Helene Sacco

Forma-se em pintura pela Ufpel, Pelotas, em 1999. Participa de workshops de arte com Jean Lancri, Pierre Baque e Eliane Chiron. Sua obra caracteriza-se por experiências tridimensionais e em vídeo. Cria objetos que seduzem o olhar para vórtices onde a imagem virtual é amparada pelo objeto que propõe um contato afetivo direto com o observador. Entre as exposições coletivas de que participa destacam-se II Top Student de Artes Plásticas, no Instituto Norte-Americano, Porto Alegre, 1997; e Salão de Arte Universitária de Santa Maria, 1998 .

(Itaú Cultural - Rumos Visuais 1999/2000)

Laranja de mostra

Aqui está uma amostrinha
do trabalho da Helene Sacco.
Manda mais maninha!
Sei que tem novidade na área.


UMA FENDA NO TEMPO
(mais um das antiga)


Considere que, em pleno centenário da teoria da relatividade, estamos vivendo uma aceleração do tempo. Presos em um torvelinho de atividades e pensamentos automáticos e repetitivos, se forma uma casca em torno das nossas vidas. Essa vertigem diária impede a contemplação e análise do quotidiano da construção social. De repente, a casca começa a produzir fissuras, frestas através das quais se pode espiar a nós mesmos e aos outros. São fendas no tempo que nos permitem congelar imagens que falam de nós muito mais do que poderíamos presumir. Destas escorre arte contemporânea.
Voltando no tempo retroceda até aos tempos de Vermeer, século XV. Quanto de tempo teria ele gasto para conceber sua “A Leiteira”? Uma cena corriqueira de sua organização familiar e que, no entanto, congela a imagem projetando para a contemporaneidade a poesia lenta dos dias do pintor. Lenta porque aqueles eram dias lentos. As mulheres da vida e da casa de Vermeer se movimentavam lentamente em direção às janelas e por estas entrava uma luz também lenta. Uma velocidade que talvez permitisse luz à poética daquelas sentimentalidades clandestinas que ele retratou.
Como não gosto de saudosismo, especialmente daquele que remete a coisas que não vivi ou que pelo menos não tenho consciência de tê-las vivido, voltemos para 2005. Aqui reside minha paixão: a bricolagem frenética das imagens e seus significados. Essas produzem com velocidade alucinante, outras imagens de mercadorias obsoletas como celulares-tijolos, celulares que emitem constrangedoramente a 9ª Sinfonia de Beethoven, disquetes de 5 ¼, disquetes de 3 ½, Zip drivers, carros sem injeção eletrônica... E quem diria, uma ponte, um sucatão que costumava ligar Pelotas a Rio Grande. Até quando mesmo? Não lembro. Mas ontem à noite; lá no ILA (Instituto de Letras e Artes), Alberto Rosa, número 69; a vi exposta com o nome de “Reponte” (Alexandre Lettnin). Na mesma ocasião/exposição, mas em outra parede, havia “Fendas” (Helene Sacco). Frestas por onde escorria o quotidiano imagético. Nelas se podia espiar a vida ou será que eram elas que nos espiavam? As fendas tinham o poder de recortar a realidade e a deslocar no tempo e espaço, produzindo um congelamento. Algo como: “parem o mundo que eu quero espiar”. É interessante observar como frestas, fendas, rachaduras e dobras têm o poder de atrair vida. Destas é que brota, numa espécie de biogênese invisível, “Minha Casa” (Paulo Damé), abrigo do olhar. Em outra parede, de lado oposto, uma gaveta acomodava memórias em branco, “O que você guarda em suas gavetas?” (Kelly Wendt), contos da biogênese a espera de uma vivência temporal ao gosto da tecnologia ainda imprevisível. Mas, a primeira coisa que se vê, na sala de exposições do ILA, é “Fronteira do Visível” (Helena Canaã), sintetizando todo o resto: as imagens frenéticas presas e esmagadas pela dobra do tempo formando um borrão no espaço.
(Mila Sacco - ago 2005)
Saudade/Remake

Estou começando a publicar, hoje, meus escritos desde o começo da faculdade e que nunca foram mostrados a ninguém, somente o fiz no CMI. Não sei bem o que pretendo com isso, mas estou com várias saudades...
Começarei por este que me é muito caro, pois chegou de alguma forma às mãos do artista plástico Edson Barrus. Este me mandou um e-mail muito importante para mim. Agradeço a ele por me mostrar, na prática, o que Derrida falava sobre a traição do subjétil e como a verdadeira leitura se faz na mente do espectador.
(Mila Sacco)


Meu olhar sobre o Cão
Ainda na década de 90, em uma das edições do Itaú Cultural, São Paulo, foi apresentada uma instalação intitulada “Cão Mulato” de autoria de Edson Barrus. Tratava-se de estranha traquitana, engenhoca, feita com equipamento de informática obsoleto. Na verdade sucata garimpada no lixo da sociedade informatizada. Monitor, cpu, impressora e, sei lá mais o que, interligados a outros debaixo de uma barraca feita de retalhos de restos de roupas e tecidos usados.
Parecia impossível que aquilo tudo funcionasse. Mas, não só funcionava como de forma matricial, imprimia incansavelmente:
cãomulatocãomulatocãomulatocãomulatocãomulatocãomulato cãomulatocãomulatocãomulatocãomulatocãomulatocãomulato cãomulatocãomulatocãomulatocãomulatocãomulatocãomulato...

Costuma-se denominar de cão todo aquele que possui o menor valor possível. E o que vem a ser mulato? Talvez aquele a quem é negado, até mesmo, o direito de pertencer a uma etnia. Logo, o quê pode estar, numa escala de valores arbitrária, abaixo de um cão mulato? No entanto, lá estava a traquitana inquietante a repetir:
cãomulatocãomulatocãomulatocãomulatocãomulatocãomulato cãomulatocãomulatocãomulatocãomulatocãomulatocãomulato cãomulatocãomulatocãomulatocãomulatocãomulatocãomulato...

Já não é de ontem que se faz arte de lixo, que o diga o mestre Hélio Oiticica. Mas, a questão aqui é: o restolho da mídia, o dejeto da indústria cultural pode se autoreciclar? Degradar-se, re-organizar-se produzindo um novo organismo? Assim, como dizia Chico Science: “me organizando posso desorganizar, desorganizando posso me organizar”.
Pois é, tendo há muito tempo silenciado na memória o ruído da engenhoca, dou de cara com ela, estava lá na MTV, dando entrevista, com a maior cara de cão mulato, um tal de Marcelo D2.
Estava posto o paradoxo: o cão mulato agora era indústria na MTV e, ainda ontem, era lixo; dependendo, é claro, do momento em que se olha e congela o movimento do anel da reciclagem.
Faz pelo menos meio ano que escuto a colagem e bricolagem de lixo e cultura do cara e ainda tem coisa lá neguinho, tem coisa lá... Me re-apaixonei pelo cão mulato e tô me perguntando: Qualé neguinho, qualé?! É tem alguma coisa lá no
hip-hop...
(Mila - set 2003)


Deu pra ti Negra Li
Ao mesmo tempo em que lia na web que centenas de soldados e policiais, a pé ou a cavalo, controlaram os movimentos da multidão e que tanques antidistúrbios foram posicionados nas imediações da festa batizada de "África Unida" - show em homenagem aos 60 anos de Bob Marley, na Etiópia - assistia ao show da Negra Li na MTV. É incrível como ajuntamento de povo mete medo nas autoridades, principalmente se forem negros comemorando um líder. O que não é o caso da nossa conterrânea, a Li. Parece que este se trata de um evento bem menos preocupante para as autoridades. Afinal, o pessoal que vive sob o signo da Nike é bem menos ameaçador, um caso apenas para segurança particular mesmo.
Já há algum tempo penso em dar uma olhadinha no trabalho da moça. Sabe como é, pra ver qualé neguinha? Então lá estava ela dando performance no “Circo da MTV” e, lógico, como não poderia faltar: com logo.
Como gosto de Hip-hop tento ser paciente com essa mania que os manos têm de ostentar no peito o carimbo da casa grande. Como aqueles filhos caçulas, adolescentes, dos quais se tenta compreender as incríveis incoerências. E estava lá a Negra Li, com seu novo cabelo black, vestida com uma simpática e antenadíssima jacket metálica com as famosas três listras retrô e ostentando no peito a marca Adidas.
Sem dúvida, tudo a ver! A mina tá cabendo legal no papel de “neomucama”. Ou então não foi avisada da gigantesca senzala do mundo colonizado que hospeda, pelo tempo que convier aos donos dos carimbos, as fábricas das jackets antenadíssimas da nossa mucaminha. Nestas fábricas/senzalas homens e mulheres, sem garantias nem futuro, trabalham produzindo as peças usadas pelos manos e pelas minas da hora.
É interessante observar a fascinação que estas roupas com marcas como Nike, Reebock, a própria Adidas, entre outras, exercem no imaginário dos jovens de países periféricos. Quem já não ouviu falar naqueles casos de roubos e até assassinatos motivados pelo desejo ensandecido, despertado e estimulado pela propaganda e, ainda, reforçado pelos artistas, fiéis adeptos de marcas globalizadas? Porém, todos conhecemos o dito: a propaganda estimula o consumo de produtos que a maioria não tem meios para consumir. Assim, o consumo de produtos, digamos, não oficiais, é simultaneamente estimulado.
Engorda-se a clientela da pirataria. Legal! Sempre gostei de histórias de piratas. Acho que é algum tipo de anarquismo ou vingança das massas manipuladas pela mídia. Mas, que ironia! Lá no meio destes produtos “alternativos”... no canto da prateleira do camelô... ali no cantinho... não é o Cd da Negra Li e o do D2?!
Mundo pequeno esse, né?
Sinceramente, aqui vai o meu recado, não no mic, mas no teclado (que sou a favor da inclusão digital): Já tá além da conta a postura de mucama do Hip-hop. Francamente não dá para fazer merchandising das marcas bordadas nos bonés e impressas a ferro e fogo nos corpos e mentes dos trabalhadores semi-escravos.
Definitivamente: deu pra ti, Negra Li!
(Mila - fev 2005)


Charge

Recebi esta de uma amiga que está em Brasília (mts saudades). Sou apaixonada por charges - que saudades do Henfil e de outros tempos...




"A esperança na corda bamba de sombrinha.E a cada passo dessa linha pode se machucar.Ai,azar! A esperança equilibrista,sabe que o show de todo artista, tem que continuar." (João Bôsco)



domingo, outubro 15, 2006


Barulhinho bom



O barulho da chuva me faz relembrar momentos que na imaginação podem parecer melhores do que realmente foram...

Chuva traga o meu benzinho
Pois preciso de carinho
Diga a ela pra não me deixar triste assim...
O ritmo dos pingos ao cair no chão
Só me deixa relembrar
Tomara que eu não fique a esperar em vão
Por ele que me faz chorar.
Oh, chuva traga o meu benzinho!
Pois preciso de carinho
Diga a ele pra não me deixar triste assim
(Demetrius)

quinta-feira, outubro 12, 2006


Esse é o nosso mural OOOOlívio
Quem quiser é só chegar!


Mais descontróooole aéreo nos EUA

Parece que nossos vizinhos metidos a besta, sabe aqueles que sempre têm um gramado melhor. Pois é, estão com problemas novamente. Mas, deixe estar Sr Busch, o descontrole existe nas melhores famílias, isto é, países.

O acidente desta quarta-feira aconteceu exatamente cinco anos e um mês depois do maior atentado terrorista da história nos EUA, em 11 de setembro de 2001, quando as torres gêmeas no World Trade Center, também em Nova York, foram derrubas por dois aviões.
(Uol - http://noticias.uol.com.br/ultnot/reuters/2006/10/11/ult27u58365.jhtm)


Fase Icônica
ainda na fase icônica, com as cores ainda necessárias para me expressar, lanço mão de um presente que minha alma amiga preferida me deu:

"Há um certo azul do céu
que é tão intenso que
o sangue é mais vermelho"
(Paul Claudell)

Ps.: Dê isso já tá virando clichê!

Mas, ainda não consegui largar...

sexta-feira, outubro 06, 2006


Imagine


Um jatinho, brasileiro, pilotado por brasileiros e transportando brasileiros. Entre eles, um jornalista arrogante brasileiro. Imagine que esse mesmo jatinho batesse em um avião, do tipo boeing, dos EUA, em espaço aéreo dos EUA, matando 154 norte-americanos. Meu amigo, tenho certeza: tortura e prisão em Guantânamo seriam pouco para os pobres cucarachas!
No entanto,bem se sabe que a situação foi inversa. São 154 almas brasileiras que agora estão sendo choradas por suas famílias.
Por isso, acho que algumas perguntas seriam pertinentes:

- Como e quem deu licença para esse jatinho trafegar tão livremente em nosso espaço aéreo?

- O que faziam sobrevoando a região amazônica?

- Que tipo de trabalho faz o jornalista Ianque?

- O que é preciso para que um jatinho qualquer entre no espaço aéreo brasileiro?

- Que tipo de visto estes elementos possuíam?

- Por que é tão fácil conseguir visto para entrar no nosso país se para um cucaracha pode custar a sua própria vida?

- O que faz com que congressistas norte-americanos, os senhores Peter King e Steve Israel, pensem que os pilotos do jatinho devam ser libertados antes do esclarecimento do caso?

- Por que estes mesmos políticos do império norte-americano procuraram a abominável srª Condaleeza Rice para interceder a favor dos desastrados pilotos?

- Por acaso se trata de alguma missão sigilosa e de interesse internacional?

Espero que os políticos e a abominável srª tenham o cuidado de se desculpar e mostrar alguma compaixão com as famílias dos 154 brasileiros, antes de exigir a libertação dos apenas 2 norte-americanos. Também espero, em respeito à nação brasileira, que os dirigentes do Brasil tratem os pilotos Joseph Lepore e Jan Paul Paladino do mesmo modo que pilotos brasileiros, envolvidos no memsmo tipo de situação nos EUA, seriam tratados.
Por último espero que o jornalista do "New York Times", Joe Sharkey, se desculpe o mais rápido possível pela declaração preconceituosa que fez sobre o trabalho dos controladores do tráfego aéreo brasileiro. E para tanto, lembre que os controladores de vôo de seu país, deixaram que outros três aviões fizessem um estrago ainda maior em 11 de setembro de 2001.

Para as almas do vôo 1907 da Gol peço a Deus que os receba e os consolem. Para as famílias desejo que tenham seu sofrimento o mais rápido possível amenizado e para a justiça brasileira peço JUSTIÇA!

quinta-feira, outubro 05, 2006


A perfeição como distorção

Há muito se diz que perfeição estética é uma forma de distorção da realidade. Desde a beleza grega com seus cânones perfeitos, até o cubismo de Picasso são anamorfoses que nos permitem apreciar reflexões e pensamentos culturalmente construídos e manifestados esteticamente.
Ontem meu mui caríssimo amigo Diniz me deu de presente um link para o site de uma fotógrafa que me deixou extasiada. Loretta produz uma espécie de simulacro do simulacro. Pinta, fotografando e fotografa pintando. São crianças, perfeitas demais quase sempre dispostas em frente à painéis que são um dos maiores desafios dos artistas: pintar imagens perfeitas de céu.
Confiram, o Diniz tem razão, vale a pena!

WWW.lorettalux.de

terça-feira, outubro 03, 2006



OOOOlívio governador

pro Rio Grande Melhorá!!!


Carinho
Recebi este carinho de minha muitíssima amigona do peito nº46, Silvinha.
Aki vai um beijão. Glamurosa, rainha do baile, poderosa...







DEUSES

Divino amante e perfeito camarada,contente à espera, invisível mas certo,seja você meu Deus.

Você, você - o Homem Ideal,belo, apto, gentil, contente e amorável, completo de corpo e amplo de espírito,seja meu Deus.

Ó Morte (pois a Vida já fez a parte dela),porteiro e mestre-sala da mansão celestial,seja meu Deus.

Alguma coisa, algo de mais poderoso,que eu melhor vejo, concebo, conheço(rompendo o laço da estagnação,a libertar, a libertar-te, ó alma),seja meu Deus.

Todas as grandes idéias, as aspirações dos povos,os heroísmos todos, gestos de arrebatado entusiasmo, Sejam meus Deuses.

Ou Tempo ou Espaço,ou figura da Terra divina e maravilhosa,ou qualquer outra figura alegreque eu, vendo, adore;ou resplandescente orbe do sol ou estrela à noite,sejam meus Deuses.


Poema de Walt Whitman
tradução de Clarah Averbuck

segunda-feira, outubro 02, 2006



"Quem me dera encontrar o verso puro,
O verso altivo e forte, estranho e duro,
Que dissesse a chorar isto que sinto!"
(Florbela Espanca)
Um olhar, um sorriso, um abraço, um afago, uma palavra...
Qualquer coisa que me liberte, de forma mágica,
libertando o berro que me sufoca.
Mila

domingo, outubro 01, 2006




Semente








"E fomos dormir com a
sensação de que tínhamos
mudado o mundo..."
(Madredeus)
É gente... pra mudar o mundo não dá para dormir.
Os sonhos nos são roubados na escuridão da noite.
Quem me der um exemplo de democracia eficiente,
Por favor, que faça o mais urgente... Mila
"Foi bonita a festa pá,
mas certamente
esqueceram uma semente
n´algum canto de jardim..."
Chico)


Como garrafa de náufrago

Dessa vez meu voto vai como garrafa de náufrago a procura de praias que lhe sejam dignas.

"Mesmo que eu mande garrafas por todo o mar
meu coração tropical partirá esse gela irá...
Vou quebrar a geleira azul da solidão e buscar
a mão do mar, procurar o mar"
(João Bosco)

quarta-feira, setembro 27, 2006




Boa noite seus merdas!!!

Gente... Ei, aí?! São 4 e meia da madruga. Vocês não tem nada melhor pra fazer do que dormir? E se alguém estiver sendo abduzido por um disco-voador? Quem vai ajudar? Já pensaram que horror? Ser abduzido por disco-voador em pleno século de ônibus espacial. Tá bem, até que tem seu charme retrô... Mas se os ETs estiverem ouvindo a Banda Calipso? E se eles forem os próprios ETs? Bah aí já é muita sacanagem com os marcianos. E se roubarem todo o estoque de Coca light do planeta? Não quero nem saber. Não vou socorrer ninguém! Vocês nem conversam comigo... Aí!? Acorda Armando!
“Eu vou fazer uma canção pra ela. Uma canção singela, brasileira. Para gravar num disco-voador... Eu vou fazer um iê-iê-iê romântico, um anticomputador sentimental. Para lançar no espaço sideral..." (Caetano Veloso)


Marcianita

Esperada marcianita
Asseguram os homens de ciência
Que em dez anos mais, tu e eu
Estaremos bem juntinhos
E nos cantos escuros do céu falaremos de amor
Tenho tanto te esperado
Mas serei o primeiro varão a chegar até onde estás
Pois na Terra sou logrado
Em matéria de amor eu sou sempre passado pra trás
Eu quero um broto de Marte que seja sincero
Que não se pinte, nem fume
Nem saiba sequer o que é rock and roll
Marcianita, branca ou negra
Gorduchinha, magrinha, baixinha ou gigante
Serás meu amor
A distância nos separa
Mas no ano 70 felizes seremos os dois
José Imperatore Marcone
Galvarino Villota Alderete
versão: Fernando César

domingo, setembro 17, 2006



Monte seu voto:
P + x ou y = ?




Já que não dá pra rir, vamos chorar



"O terror está a um passo do ridículo."
(Zé do Caixão)


Estamos nos aproximando da maior democracia do planeta: os EUA. Mesmo que ainda convivendo com os currais eleitorais (não confundamos com curra de eleitores), passamos pelas eleições publicitárias, agora estamos nas eleições "Prato Feito" (aquelas decididas pela Polícia Federal), quem sabe ascendermos às eleições que, como as de Busch, foram decididas pelo judiciário. Para, enfim, nos darmos conta que os palhaços desse circo somos nós.
Alguém invente algo urgentemente!!! Tem até mulher pregando porrada na propaganda eleitoral: "Sempre tive exemplo em casa, sou filha de militar". A "Candidata da segurança." Prendam essa louca num quartel... Deve ser tara. Dê-lhe chicote na masoca!


Mila

sábado, setembro 16, 2006


Agnus Sei
(João Bosco / Aldir Blanc)

Faces sob o sol, os olhos na cruz

Os heróis do bem prosseguem na brisa da manhã
Vão levar ao reino dos minaretes a paz na ponta dos arietes
A conversão para os infiéis
Para trás ficou a marca da cruz
Na fumaça negra vinda na brisa da manhã
Ah, como é difícil tornar-se herói
Só quem tentou sabe como dói vencer Satã só com orações
Ê andá pa catarandá que Deus tudo vê
Ê andá pa catarandá que Deus tudo vê
Ê anda, ê ora, ê manda, ê mata, responderei não!
Dominus dominium juros além
Todos esses anos agnus sei que sou também
Mas ovelha negra me desgarrei, o meu pastor não sabe que eu sei
Da arma oculta na sua mão
Meu profano amor eu prefiro assim
À nudez sem véus diante da Santa-Inquisição
Ah, o tribunal não recordará dos fugitivos de Shangri-Lá
O tempo vence toda a ilusão


Entre a cruz e a espada...


Essa vai para o Ratzinger, autodenominado Bento, que, sem querer, deixou aparecer uma pontinha de suástica sob as manguinhas...
A irracionalidade humana sempre usou crenças e culturas para agrupar rebanhos, seja na forma de mão-de-obra, seja como consumidores.
Foi pela espada que o símbolo cristão do Peixe se transformou no instrumento de tortura mais temido pelos cristãos: a cruz. Alguém imagina que a cultura judaica adotasse a suástica no lugar de sua Estrela de Davi. Mas um dos fenômenos “culturais” mais intrigantes talvez seja ainda o do Peixe que se transformou em cruz.
A cultura islâmica me é tão incompreensível quanto à católica. Nenhuma possui tradução cultural no meu imaginário. No entanto, a beleza da criação humana, na compreensão e representação do divino, é sempre uma obra esteticamente maravilhosa. Desde que se dê como processo de exercício de tolerância. Amém.
Mila Sacco

domingo, setembro 10, 2006


PASSEI MINHA VIDA PARA DVD
De tanto-em-tanto tempo, a intervalos que não sei precisar, me tranco em meu quarto, apago a luz. Certifico-me de que nenhum pontinho luminoso, nem mesmo algum tipo de ruído irão me atrapalhar. Estando tudo pronto neste meu “não lugar” (meu professor Toninho me deu este termo de presente), me ponho a projetar o filme que conta a história da minha própria vida.
Como o rolo já estava muito extenso e gasto, com medo de perder algum trecho, converti tudo para DVD. É realmente incrível (já disseram alguns autores) como a relação com novas tecnologias muda a maneira como vemos e pensamos as coisas. Agora posso, além de retroceder e avançar as cenas, dividi-las em capítulos. Organizá-las em ordem cronológica e por níveis de prazer ou de dor. Também posso ir direto àquelas em que saco o revólver (as cenas da vida das pessoas são, na maioria, clichês) e àquelas em que me atiram pelas costas.
Existem os capítulos em que sou feliz para sempre. São os meus preferidos, claro. Alguns são experimentais ou de vanguarda com cenas que possuem apenas som. As imagens, somente eu as tenho. O som do coração dos meus filhos ainda não nascidos. O som do andar em saltos-altos quando minha filha se prepara para sair ou quando chega de vagarinho na madrugada. Tem aquela inesquecível e assustadora gargalhada de homem, vindo da sala que, só logo em seguida percebo ser do filho já tão crescido e ainda tão meu bebê.
Assisto incrédula às cenas em que revolucionei e mudei para sempre o mundo usando apenas um panfleto ou um voto. Pelo menos a trilha sonora destas é muito boa.
Independentemente de tecnologia, a montagem pode ser feita obedecendo ao critério do momento. E é óbvio, isso muda todo o sentido. As montagens são as “todas poderosas” do cinema. Elas é que dão sentido aos “fatos”. Fato é aquilo que pode ser qualquer coisa...
É possível assistir à cenas de quando era criança, congelar meus sonhos e, em seguida, avançar até o ponto em que deveria tê-los realizado. Vejo que não aconteceram, mas como dizem: “eles não envelhecem...”. Mas, eu sim. Assisto à todas as vezes em que fui ferida de morte e outras em que morri. Há aquelas em que renasço trazendo as cicatrizes e o rosto meio sem graça. Aquele famoso “de paisagem”. Outras ficam lá, com seus ícones nunca acionados, propositalmente ou inconscientemente esquecidos.
Embora se tratando de um documentário, algumas seqüências de outros, perpassam as minhas. No momento em que se tocam são documentários inseridos dentro do meu próprio. Logo em seguida, só posso olhá-los como ficção. Apenas imaginar que histórias são estas. Como no caso de Bentinho e sua Capitulina, nunca saberei, apenas sofrerei.
Há algum tempo realizo um sonho: entregar o controle remoto para outra pessoa. No caso, meu analista. Ele nunca seleciona as cenas de que eu gosto. No entanto, posso acionar o comando de versão comentada. É muito bom!
Desde a última projeção, fico pensando: Será que não sou um daqueles “replicantes” de “Blade Runner” com suas vidas inventadas? Ou será que como no caso de “Capote” estou apenas esperando que a morte aconteça para escrever o FIM? E ainda dizem que não gosto de cinema...

Mila Sacco
A vida é bela, a vida é bela, a vida é bela
Vem cá, vem vê, como tem babaca na TV
Vem cá, vem cá, a vida é boa mas inventa de amargar
Quem sabe ciber, quem não sabe sobra
Baby eu te espero para o chat das cinco...
(Zeca Balero)

sexta-feira, setembro 08, 2006


(...) claro que ninguém é mais profundamente consciente da onipresença da propaganda do que os próprios publicitários, que vêem a inundação comercial como um claro e convincente convite por mais propaganda – e propaganda invasiva. Com tanta concorrência, afirmam as agências, os clientes devem gastar mais do que nunca para terem a certeza de que estão gritando tão alto que possam ser ouvidos por todos os outros. David Lubars, executivo sênior de publicidade no Omnicom Group, explica o princípio norteador do setor com mais franqueza do que a maioria. “Os consumidores, diz ele, são como baratas; você os enche de inseticidas e eles ficam imunes após algum tempo” (Klein, 2002, p. 33).

ESTOU INTOXICADA DE DETEFON POLÍTICO!!!




MATARAM A MULHER DO LÓ?


Estavam Ló, sua esposa e filhas postos em fuga de Sodoma e Gomorra e, eis que, mesmo sob as ordens do mensageiro, Ela olha para trás.

Recuemos a fita...

E a junta cônjuge: Ló e sua esposa. Submetidos ao mesmo jugo, retiravam–se de Sodoma e Gomorra pela ordem do mandatário. Embora, tendo recebido as ordens de que não olhassem para trás, a esposa olha. Olha e o faz por sobre o ombro do marido.
Por que não poderia olhar? E o que vê a mulher de Ló?
Consta que imediatamente após lançar o olhar para trás Ela transformou-se em uma estátua de sal.

Pause...

Tendo efeito peculiar, o sal destrói a possibilidade de vida, desidrata. Água é vida e a vida desta depende.

Play...

Em substituição à mulher, as filhas são postas sob o mesmo jugo. Consta, ainda que, sem mulher, Ló tendo “entornado” muito vinho pôs-se a procriar com as próprias filhas.
Distraído com a orgia, o carreteiro que conduzia a junta esqueceu-se da estátua. Esta, já não o preocupava.
Aproveitando tal desatenção, eis que Lylit põe-se a espremer sobre a estátua um favo que contém todo o mel necessário para transformar o sal em um líquido de pH fisiológico, propício à vida.
Recobrando a consciência Ela tem na memória, uma imagem ainda presa em seus olhos: a face, até então jamais vista, do carreteiro. Ela já não é mais "a mulher de Ló".
Animado com as atividades incestuosas de Ló e suas filhas, o carreteiro esquece que Elas perpetuarão os genes de quem “olha para trás” ou “oferece maçãs”.
Mila Sacco


"Qualquer pessoa que tenha lido a história da humanidade
aprendeu que a desobediência é a virtude original do homem"
Oscar Wilde

quinta-feira, setembro 07, 2006


Como termina um amor?

"Como termina um amor? - O quê? Termina? Em suma ninguém - exceto os outros - nunca sabe disso; uma espécie de inocência mascara o fim dessa coisa concebida, afirmada, vivida como se fosse eterna. O que quer que se torne objeto amado, quer ele desapareça ou passe à região da Amizade, de qualquer maneira, eu não o vejo nem mesmo se dissipar: o amor que termina se afasta para um outro mundo como uma nave espacial que deixa de piscar: o ser amado ressoava como um clamor, de repente ei-lo sem brilho (o outro nunca desaparece quando e como se esperava). Esse fenômeno resulta de uma imposição do discurso amoroso: eu mesmo (sujeito enamorado) não posso construir até o fim de minha história de amor: sou o poeta (o recitante apenas do começo); o final dessa história, assim como a minha própria morte, pertence aos outros; eles que escrevam romance, narrativa exterior, mítica."


Roland Barthes

terça-feira, setembro 05, 2006







Como cusca em procissão

Li este texto, sábado passado, e fiquei pensando: O quê seria preciso para substituir Luiz Fernando Veríssimo no espaço normalmente destinado a ele em ZH? Concluí que é necessário muito pouco. Ou pelo menos ser, neste caso uma cusca perdida em meio à cultura globalizada.
A cusca, no caso, é Cláudia Laitano. A moça se trai quando ao querer mostrar humor refinado, transborda preconceito. Prestem atenção na parte que grifei no texo. Cláudia parece ter pudores de magoar UM ROBÔ chamandô-o de empregado doméstico. Aqui reside um universo de questões sociais que como dizia Derrida: estariam ocultos entre os elementos do texto.
Além disso, mais uma vez vê-se questões de fundo sendo tranqüilamente excluídas, apagadas do teor explícito dos textos que normalmente são publicados na muito mais que superficial ZH.
Quem formata quem? Os programas de TV formatam ou são formatados pelo público? Nesta briga de cachorro grande acho que somos formatados em blocos mais ou menos homogêneos para sermos comercializados, pelas emissoras de TV, numa espécie de leilão de quem paga mais para patrocinar programas, estes sim formatadores da mercadoria/público a ser oferecida.
Cusquinha Cláudia, reparares bem, a família que era comercializada para patrocinadores de “Perdidos no Espaço” mudou muito. Mas quem a mudou? E para vender o quê para os produtores e exibidores de "Lost"?



Texto na íntegra na ZH de 02/09/06

Como cusco em procissão

Quando eu era criança, uma das minhas séries de TV preferidas chamava-se Perdidos no Espaço. Se você não é um alienígena no planeta pop, conhece a história: em um longínquo futuro (1997), a família Robinson é escolhida para iniciar um projeto de colonização espacial. Sua nave, no entanto, é sabotada por um maligno espião, o coronel Zachary Smith, condenando os Robinson a ficar zanzando pelo espaço por três temporadas (1965 - 1968). Perigos, perigos, perigos atravessavam o caminho dos Robinson a cada novo episódio, mas, tirando os alienígenas e, claro, a ausência de uma televisão na sala, tratava-se de uma típica família dos anos 60: pai, mãe, três filhos e até empregado doméstico (foi mal aí, Robô). O menino Will, com quem naturalmente as crianças se identificavam, podia enfrentar as ameaças mais terríveis da Via Láctea durante o dia, mas, como todos nós aqui na Terra, devia ser obrigado a fazer os temas e a tomar uma pílula de Toddy todas as noites antes de dormir. Passados 40 anos da estréia de Perdidos no Espaço, outro grupo de sobreviventes em um ambiente hostil e desconhecido tornou-se um fenômeno de audiência da televisão mundial. O sucesso de Lost...

Cláudia Laitano
ZH de 02/09/2006